Eu estava dirigindo e chovia fino, mas fazia sol. E como na realidade dura da rotina ninguém pensa nessas coisas eu também não pensava, mas ele estava lá. Um muito grande arco-íris cortando o céu, fazendo um arco. Que pote de ouro que nada eu queria era passar debaixo dele. Debaixo de escada a gente não cresce mais, mas debaixo de arco-íris deve ser outra coisa, né? Outra coisa melhor, bem melhor. E quanto mais eu dirigia percebia que ele acompanhava minha distância: não ficava nem mais perto, nem mais longe de mim. Era um daqueles que a gente desenha quando é criança, igualzinho ao da Thayná. A Thayná foi minha grande amiga de infância, bem infância mesmo. Ela era muito loira com os cabelos muito compridos. E na escolinha a gente sempre ficava junto e fazia tudo junto. Dividíamos nossa mesa de desenho, dessas quadradinhas com banquinhos em volta, pra criança mesmo, com a Larissa, a Raíssa e uma outra criança que eu já não me lembro mais. A Larissa era muito escandalosa, a Raíssa tinha o dedão da mão amarelo de tanto chupar e por isso eu era mais próxima da Thayná que compartilhava comigo meus ideais de menina, sem escândalos e sem dedo chupado. A gente sempre desenhava com giz de cera e eu nunca soube se as idéias dos desenhos eram minhas e ela copiava ou se eram dela e eu copiava. Talvez fosse um pouco de cada. E nessa fase da infância a gente não liga pra isso, só depois é que nosso ego grita e começam a rolar aquelas acusações “tia, ela me copiou” “ o meu é mais bonito” e essas coisas. Lembro-me bem que nos nossos desenhos sempre habitava um arco-íris, acho que era por causa da cores, porque aí dava pra usar todos os gizes de cera. E a Thayná sabia certinho as sete cores do arco-íris. E ela dizia que tinha que ser igualzinho era de verdade. E era muito bom perseguir a verdade. No carro, vendo aquele monstro de cores fiquei pensando que antes, eu que vivia no subjetivo tentava imitar e me aproximar com todas as forças do real, do concreto. Hoje, que vivo no concreto da realidade crua fico tentando imitar e me aproximar com todas as forças do subjetivo, do abstrato, da transcendência. Fiquei pensando se a Thayná tava vendo o arco-íris também. E se ela lembra disso tudo, da nossa mesinha, dos desenhos, do dedo amarelo da Raíssa. Na hora em que vi o arco-íris no céu minha primeira vontade foi a de ligar pra alguém pra compartilhar, mostrar, fazer perceber e tal. Mas depois desisti porque percebi que às vezes, existem coisas que a gente não pode compartilhar. Existem coisas que a gente não precisa compartilhar. Existem coisas que eu tenho que vivenciar sozinha. Então eu abri o vidro bem aberto e deixei a chuva entrar. E quando eu perguntei se alguém tinha visto o arco-íris enorme que inundou toda a cidade, todos responderam que não. A gente só pode ver e vivenciar as coisas que a gente quer. E como eu quis naquele dia ver aquele arco-íris. Quis tanto, mas tanto, que chego a acreditar que ele apareceu só pra mim.
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