É que vivo me dividindo. Estou aqui e estou lá. Sou uma e sou pouca, sou duas, três, oito e aí sou muitas. Nos dias de solidão sou uma só, sem divisão. Hoje por exemplo, sou três. Domingo é dia de três. Mas tem domingo que a divisão é múltipla de nove. Divido o tempo, o espaço, meus membros, meus olhos e olhares. Divido minhas unhas, minha mente. Divido opiniões, na verdade, opino muito pouco em público. Deveria opinar mais. Divido pensamentos. Divido rubrica. Divido a escrita nata. Alguns sonhos e deixar dormir não divido não. Mantenho-os unos. Mantenho-os meus. Sinto a vida mais ampla quando muitas eus estão a bailar. Sinto o universo inteiro ao meu redor. Pago o preço de me ter em mil. Não é barato. Nem dá pra pechinchar. No geral, a gente tem que saber das consequências dos nossos atos e ter peito (culhão) o suficiente pra aguentar o tranco. Isso eu tenho. Dividido também. Divido esse medo de pôr os pés pelas mãos. Divido minha vontade de ir embora em várias pessoas de mim. Dividindo parece que a vontade diminiu. Ou, dependendo do ângulo, aumenta. Ainda não sei dividir minha culpa. Essa é difícil. Ando aprendendo. Ando me perdendo também. Dividir-se não é mole. Mas eu gosto. Eu quero. Eu preciso. E cada eu é uma vontade. E divido minhas angústias. Divido minha espera. Divido o receio de perder. Perder pessoas, perder amores, perder amigos. Não dá pra dividir e nem dividir-se depois de uma perda. É indivisível. É inafiançável. Não dá pra pagar preço nenhum e dói. Mas o grande mote é ir lançando-se. Divido casa. Divido apartamento. Divido-me em dívidas pagãs. Divido ouro. E esse tenho pouco. Corro atrás do vento que me divide também. Estou sempre na aba da brisa. Agora essa, quente de verão. Divido massagem. Divido-me em água. Pura, fresca e estranhamente não divisível. Vivo me dividindo em metades que se juntam e formam alguém. Completamente líquida. Insólida. Sem pedaços.
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